domingo, 22 de maio de 2011

O sacríficio do Rei III

Somos pó, mas Deus nos Ama, Ámen!

Seja como for, a morte de Luís XVI surge como um enigma impenetrável à consciência do nosso tempo, sinal insistente e inevitável que remete para uma outra ordem de coisas, uma economia insuspeitada da existência terrestre que parece ultrapassar e contradizer os esquemas mentais mais comummente aceites: paganismo, espiritualismo, ateísmo, racionalismo... Centro secreto e alicerce oculto da modernidade, o sacríficio do rei parece ter sido rasurado pela normalização historiográfica, relegado como uma antiguidade para sempre cristalizada num passado morto, que um punhado de nostálgicos quererá depois brandir como se fosse um espectro. De facto, Jaurès, numa passagem célebre, dirá também dos reis da Restauração, aliás enfeudados à nova religião: os reis poderão por momentos regressar. Faça-se o que se fizer, doravante não serão mais do que fantasmas.» Fantasmas, com efeito, ecos enfraquecidos do rei sacrificado, cujos passos sobre o cadafalso não cessam, no entanto, de ressoar nos corredores da história da França, como sobre os terraços do castelo de Elsenor. Mas este rei sacrificado não é um fantasma, continua ainda vivo. Com efeito, pela sua abnegação, coragem e dedicação, Luís XVI representa um exemplo de vida, a do único grande homem da Revolução, sem dúvida, aquele que ninguém soube ver e escutar. E, inversamente, poderá bem acontecer que, superando por fim as aparências, se descubra um dia, sob o espírito da Revolução, sob os seus sonhos pseudomessiânicos de uma nova ordem e das suas exigências de «sacríficio infintio» (Michelet), um espectro caricato que dia após dia vai tentando arrastar a humanidade cativa para as trevas e para a morte - um «espectro que atormenta a Europa», como dizia Marx referindo-se ao comunismo. Talvez um dia, sem ilusão e sem nostalgia, saibamos voltar-nos para Luís XVI para esconjurar todos esses fantasmas e aprender com ele os mistérios da vida, do sofrimentos, da morte e da ressurreição:

- E verei eu o bosque amarelo e o claro vale,
A Esposa de olhos azuis, o homem de fronte vermelha, ó Gália
E o branco Cordeiro Pascal, a seus amados pés,
- Miguel e Cristina -, e Cristo! - fim do Idílio.

Henri Beausoleil, Filósofo

Fonte: O Livro Negro da revolução Francesa DIR. Renaud Escande

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