Da nossa dor Senhor, afastai o ódio ensinando-nos a ser misericordiosos, Ámen!
LIBERDADE
A melhor descrição de liberdade, pensada pelos modernos e aplicada pela Revolução Francesa, encontra-se, sem dúvida, na obra de Simone de Beauvioir, Pour une Morale de L'Ambiguité. Neste livro, onde a autora tenta honestamente fundar uma moral baseada sobre a liberdade, vejamos como ela descreve esta última: «[...] pretender o desvendar do mundo, querer-se livre, constitui um só e único movimento. A liberdade é a fonte de onde surgem todas as significações e todos os valores; é a condição original de qualquer justificação de existência; o homem que procura justificar a sua vida deve querer antes de mais e absolutamente a própria liberdade.»
Estabelecer, como faz Simone de Beauvoir, a liberdade como fonte de toda a moral, é propor que a vida humana se assemelhe a esses parafusos sem princípio nem fim que giram indefinidamente e cuja própria visão provoca vertigem, já que o olhar não pode deter-se sobre coisa alguma, pois a curva é contínua, mas não conduz a lado algum. Mesmo que mais adiante, na sua obra, a autora esteja bem ciente do risco e recuse a ideia de que a liberdade seja «este átomo epicurista que deriv[a]. não importa em que momento, não importa em que direcção», não impede que, se nada fundamenta a liberdade, ela não pode, portanto ter outras finalidades que não sejam ela mesmo.
Ao decretar legislativamente que os homens nasciam livres por natureza e por direito, os revolucionários fantasiaram a natureza e atribuíram ao direito o que ele não pode fazer.
Apenas se é livre por dom e engana-se aquele que está convencido de que pode garantir a perenidade de um dom decretando que ele é natural ou proclamando o direito a ele. Um dom é muito mais perene do que a natureza (que dá e torna a tirar, a começar pelo primeiro dos seus dons que é a vida); quanto ao direito escrito, um outro escrito pode anulá-lo, aí reside toda a sua fraqueza. O que existe pelo escrito pode cessar de existir por meio de uma outro escrito. Em contrapartida, o que é dado não pode retomado, visto que o dom é uma extensão de si mesmo que nunca pode ser recuperada. Se Deus nos criou livres, é porque Ele mesmo se deu e não pode retomar-se sem nos destruir e sem se destruir.
Se os homens nascem livres, é porque isso se faria naturalmente e é, portanto contraditório decretá-lo por escrito. O que é escrito é justamente o que não é natural e tem necessidade desse escrito para existir.
Ao confundir e misturar as liberdades públicas (que existiam sob a realeza e de que o rei era o garante, pois que elas dependiam de ele manter a sua palavra, muito mais sólida do que o escrito) e a liberdade pessoal (cujo centro é a minha consciência), os revolucionários correram o risco de que elas se contradigam uma à outra e se impeçam de funcionar.
É o meu pai que me ensina a liberdade individual (em nenhum lado isto está escrito e todavia, desde a noite dos tempos, é assim) e é o rei que garante as liberdades públicas.
Foi um dos primeiros pensadores contra-revolucionários , Joseph de Maistre, que viu imediatamente que o problema da Revolução consistia no problema do escrito:
Estabelecer, como faz Simone de Beauvoir, a liberdade como fonte de toda a moral, é propor que a vida humana se assemelhe a esses parafusos sem princípio nem fim que giram indefinidamente e cuja própria visão provoca vertigem, já que o olhar não pode deter-se sobre coisa alguma, pois a curva é contínua, mas não conduz a lado algum. Mesmo que mais adiante, na sua obra, a autora esteja bem ciente do risco e recuse a ideia de que a liberdade seja «este átomo epicurista que deriv[a]. não importa em que momento, não importa em que direcção», não impede que, se nada fundamenta a liberdade, ela não pode, portanto ter outras finalidades que não sejam ela mesmo.
Ao decretar legislativamente que os homens nasciam livres por natureza e por direito, os revolucionários fantasiaram a natureza e atribuíram ao direito o que ele não pode fazer.
Apenas se é livre por dom e engana-se aquele que está convencido de que pode garantir a perenidade de um dom decretando que ele é natural ou proclamando o direito a ele. Um dom é muito mais perene do que a natureza (que dá e torna a tirar, a começar pelo primeiro dos seus dons que é a vida); quanto ao direito escrito, um outro escrito pode anulá-lo, aí reside toda a sua fraqueza. O que existe pelo escrito pode cessar de existir por meio de uma outro escrito. Em contrapartida, o que é dado não pode retomado, visto que o dom é uma extensão de si mesmo que nunca pode ser recuperada. Se Deus nos criou livres, é porque Ele mesmo se deu e não pode retomar-se sem nos destruir e sem se destruir.
Se os homens nascem livres, é porque isso se faria naturalmente e é, portanto contraditório decretá-lo por escrito. O que é escrito é justamente o que não é natural e tem necessidade desse escrito para existir.
Ao confundir e misturar as liberdades públicas (que existiam sob a realeza e de que o rei era o garante, pois que elas dependiam de ele manter a sua palavra, muito mais sólida do que o escrito) e a liberdade pessoal (cujo centro é a minha consciência), os revolucionários correram o risco de que elas se contradigam uma à outra e se impeçam de funcionar.
É o meu pai que me ensina a liberdade individual (em nenhum lado isto está escrito e todavia, desde a noite dos tempos, é assim) e é o rei que garante as liberdades públicas.
Foi um dos primeiros pensadores contra-revolucionários , Joseph de Maistre, que viu imediatamente que o problema da Revolução consistia no problema do escrito:
Quanto àquele que empreende escrever leis ou constituições civis, e que julga que, porque as escreveu, pôde conferir-lhes a evidência e a estabilidade adequadas, quem quer que seja este homem, particular ou legislador, e que o digam ou não, fica desonrado, porque, dessa maneira, prova que ignora igualmente o que é a inspiração e o delírio, o justo e o injusto, o bem e o mal: ora, esta ignorância é uma ignomínia, ainda que toda a massa do vulgo aplaudisse.
Regressa agora à questão dos começos e das origens:
Toda a instituição falsa escreve muito, porque sente a sua fraqueza, e procura apoiar-se [...], nenhuma instituição grande e real poderia estar fundada sobre uma lei escrita, já que os próprios homens, instrumentos sucessivos da instituição, ignoram aquilo em que deve tornar-se, e que o crescimento imperceptível é o verdadeiro sinal da duração, em todas as ordens possíveis de coisas.
A actual inflação legislativa, em que as leis se sucedem às leis que nem mesmo tempo têm tempo de serem regulamentadas antes de serem anuladas por outras leis, constitui a prova de que até os legisladores já não acreditam naquilo que fazem.
O meu pai ensina-me a educar a minha consciência de homem livre. É ele que me faz entrar no mundo dos homens onde devo aprender a discernir o bem e o mal porque a liberdade é em primeiro lugar e antes de tudo a capacidade de, no momento crucial, dizer «sim» ou «não».
Desde sempre e em todos os tempos, homens e mulheres devem ter dito, e deverão dizer, «não» ou «sim» quando tudo à sua volta conspira para que se calem. Sob a pior das ditaduras ou sob o regime mais liberal, ninguém está exonerado do dever de se pronunciar a título pessoal.
O grave erro da teoria da liberdade republicana é o de ter feito crer um regime de liberdades públicas (que se assemelha muito a este programa: «Nós ocupamo-nos de tudo, inclusivamente da vossa liberdade») possa instaurar a liberdade.
A liberdade é eminentemente pessoal e árdua. Ela é jorro intempestivo. Não se exerce senão para cada um e em momentos específicos. O homem deve fazer raramente prova de liberdade mas, quando tem de o fazer não deve desperdiçar essa oportunidade. Quando Jean-Paul Sartre escrevia: «Nunca fomos mais livres do que quando estivemos sob a ocupação Alemã», explicava bem que a liberdade apenas se pode exercer face àquilo que a nega. Não existem países livres e países «não livres», somente os homens o são, ou não. Foi preciso uma grave ignorância do que é a liberdade neste mundo que se diz «livre» para ousar uma tal pretensão.
A ideia, segundo a qual um regime de liberdades públicas protege a liberdade individual, é um logro, não pode senão eventualmente garantir contratos que liguem os homens entre eles. Uma liberdade conquista-se é nisso que consiste a sua própria essência. Pretender proteger a liberdade individual é aniquilá-la.
Há por detrás desta ideia de regime de liberdades públicas a ideia do progresso moral da humanidade e por conseguinte a negação da possibilidade do mal. Todo o mal não é senão um defeito que se vai poder erradicar por meio da educação ou da ciência que o Estado se encarrega de proporcionar a cada um. Tudo é susceptível de ser melhorado. O progresso vai balizar o progresso moral (e ainda menos político) na história da humanidade. Este desconhecimento do mal, esta recusa em reconhecer que cada homem cada mulher terá de lutar até ao fim dos tempos contra os mesmo - exactamente os mesmos - males que os seus antepassados, conduziu ao inferno esta humanidade liberta.
O rei não era o garante da liberdade do homem (não tinha essa omnipotência), mas garantia as liberdades públicas, as que permitiam o viver em comum numa negociação constante entre os súbditos.
«Súbdito» não significa apenas «submisso», mas significa também «existir graças a e por um outro». Existir graças a, é existir por dom. O termo «súbdito» não foi, politicamente, lido senão em termos de submissão. Ora existe um outro elemento nesta palavra, que é este outro ao qual eu estou submetido. Um súbdito político existe porque um outro existe e, mais ainda, esse outro preocupa-se comigo e talvez queira mesmo que eu exista pessoalmente e politicamente. O súbdito político existe porque alguém, além dele, o deseja. Ser um súbdito político significa, pois, existir politicamente pela vontade de um mais forte e de uma mais poderoso e que este poder não serve em primeiro lugar para negar a existência do mais fraco, mas, antes para lhe conferir a existência política. O que a República recusou foi o dom da graça da existência política. Mas, ao recusá-lo, criou cidadãos que apenas existem pelo facto de estarem ali. Postados. Sem qualquer justificação. Um cidadão está portanto ali postado, tal como o está um chinquilho num jogo, a igual distância dos outros chinquilhos a ponto de uma máquina poder encarregar-se de os deslocar, de os levantar ou de os mudar de lugar. Já não é necessária a vontade humana nas relações dos chinquilhos entre eles.
Um súbdito, diversamente do chinquilho, nunca é anónimo, nunca é idêntico a um outro, porque ele existe por uma vontade humana. E compete a esta fonte garantir a minha liberdade pública, protegê-la e ser essa terceira pessoa que fará justiça quando ela for ameaçada.
No nosso sistema político actual em que conferimos a nós mesmos a nossa liberdade (tanto a liberdade interior como a liberdade política), que vale esta liberdade? Como posso ser eu mesmo o garante da minha própria liberdade? Que valor tem esta liberdade senão a própria liberdade que me dou a mim mesmo? Como posso conhecer o meu valor, e por conseguinte a minha liberdade, se mais ninguém além de mim a revela e me chama a ela?
E, finalmente, que relação mantenho com os outros, livres como eu? Se a minha liberdade me é atribuída por mim mesmo e se o meu próximo faz o mesmo que eu, é inevitável o entrechoque das liberdades ao ponto de reduzir a lei e o direito a esta falsa doutrina dotada de um falso bom senso: «A minha liberdade pára onde começa a de outro.» Que pobre liberdade, que mediocridade, que mesquinhez, que baixeza, quando a minha liberdade é tornar o outro ainda mais livre do que eu, lembrando-lhe quem lha conferiu. Não existe constrangimento entre as liberdades dos homens, mas sim comunicação mútua e interpelação constante.
Fonte: O Livro Negro da revolução Francesa DIR. Renaud Escande «
Regressa agora à questão dos começos e das origens:
Toda a instituição falsa escreve muito, porque sente a sua fraqueza, e procura apoiar-se [...], nenhuma instituição grande e real poderia estar fundada sobre uma lei escrita, já que os próprios homens, instrumentos sucessivos da instituição, ignoram aquilo em que deve tornar-se, e que o crescimento imperceptível é o verdadeiro sinal da duração, em todas as ordens possíveis de coisas.
A actual inflação legislativa, em que as leis se sucedem às leis que nem mesmo tempo têm tempo de serem regulamentadas antes de serem anuladas por outras leis, constitui a prova de que até os legisladores já não acreditam naquilo que fazem.
O meu pai ensina-me a educar a minha consciência de homem livre. É ele que me faz entrar no mundo dos homens onde devo aprender a discernir o bem e o mal porque a liberdade é em primeiro lugar e antes de tudo a capacidade de, no momento crucial, dizer «sim» ou «não».
Desde sempre e em todos os tempos, homens e mulheres devem ter dito, e deverão dizer, «não» ou «sim» quando tudo à sua volta conspira para que se calem. Sob a pior das ditaduras ou sob o regime mais liberal, ninguém está exonerado do dever de se pronunciar a título pessoal.
O grave erro da teoria da liberdade republicana é o de ter feito crer um regime de liberdades públicas (que se assemelha muito a este programa: «Nós ocupamo-nos de tudo, inclusivamente da vossa liberdade») possa instaurar a liberdade.
A liberdade é eminentemente pessoal e árdua. Ela é jorro intempestivo. Não se exerce senão para cada um e em momentos específicos. O homem deve fazer raramente prova de liberdade mas, quando tem de o fazer não deve desperdiçar essa oportunidade. Quando Jean-Paul Sartre escrevia: «Nunca fomos mais livres do que quando estivemos sob a ocupação Alemã», explicava bem que a liberdade apenas se pode exercer face àquilo que a nega. Não existem países livres e países «não livres», somente os homens o são, ou não. Foi preciso uma grave ignorância do que é a liberdade neste mundo que se diz «livre» para ousar uma tal pretensão.
A ideia, segundo a qual um regime de liberdades públicas protege a liberdade individual, é um logro, não pode senão eventualmente garantir contratos que liguem os homens entre eles. Uma liberdade conquista-se é nisso que consiste a sua própria essência. Pretender proteger a liberdade individual é aniquilá-la.
Há por detrás desta ideia de regime de liberdades públicas a ideia do progresso moral da humanidade e por conseguinte a negação da possibilidade do mal. Todo o mal não é senão um defeito que se vai poder erradicar por meio da educação ou da ciência que o Estado se encarrega de proporcionar a cada um. Tudo é susceptível de ser melhorado. O progresso vai balizar o progresso moral (e ainda menos político) na história da humanidade. Este desconhecimento do mal, esta recusa em reconhecer que cada homem cada mulher terá de lutar até ao fim dos tempos contra os mesmo - exactamente os mesmos - males que os seus antepassados, conduziu ao inferno esta humanidade liberta.
O rei não era o garante da liberdade do homem (não tinha essa omnipotência), mas garantia as liberdades públicas, as que permitiam o viver em comum numa negociação constante entre os súbditos.
«Súbdito» não significa apenas «submisso», mas significa também «existir graças a e por um outro». Existir graças a, é existir por dom. O termo «súbdito» não foi, politicamente, lido senão em termos de submissão. Ora existe um outro elemento nesta palavra, que é este outro ao qual eu estou submetido. Um súbdito político existe porque um outro existe e, mais ainda, esse outro preocupa-se comigo e talvez queira mesmo que eu exista pessoalmente e politicamente. O súbdito político existe porque alguém, além dele, o deseja. Ser um súbdito político significa, pois, existir politicamente pela vontade de um mais forte e de uma mais poderoso e que este poder não serve em primeiro lugar para negar a existência do mais fraco, mas, antes para lhe conferir a existência política. O que a República recusou foi o dom da graça da existência política. Mas, ao recusá-lo, criou cidadãos que apenas existem pelo facto de estarem ali. Postados. Sem qualquer justificação. Um cidadão está portanto ali postado, tal como o está um chinquilho num jogo, a igual distância dos outros chinquilhos a ponto de uma máquina poder encarregar-se de os deslocar, de os levantar ou de os mudar de lugar. Já não é necessária a vontade humana nas relações dos chinquilhos entre eles.
Um súbdito, diversamente do chinquilho, nunca é anónimo, nunca é idêntico a um outro, porque ele existe por uma vontade humana. E compete a esta fonte garantir a minha liberdade pública, protegê-la e ser essa terceira pessoa que fará justiça quando ela for ameaçada.
No nosso sistema político actual em que conferimos a nós mesmos a nossa liberdade (tanto a liberdade interior como a liberdade política), que vale esta liberdade? Como posso ser eu mesmo o garante da minha própria liberdade? Que valor tem esta liberdade senão a própria liberdade que me dou a mim mesmo? Como posso conhecer o meu valor, e por conseguinte a minha liberdade, se mais ninguém além de mim a revela e me chama a ela?
E, finalmente, que relação mantenho com os outros, livres como eu? Se a minha liberdade me é atribuída por mim mesmo e se o meu próximo faz o mesmo que eu, é inevitável o entrechoque das liberdades ao ponto de reduzir a lei e o direito a esta falsa doutrina dotada de um falso bom senso: «A minha liberdade pára onde começa a de outro.» Que pobre liberdade, que mediocridade, que mesquinhez, que baixeza, quando a minha liberdade é tornar o outro ainda mais livre do que eu, lembrando-lhe quem lha conferiu. Não existe constrangimento entre as liberdades dos homens, mas sim comunicação mútua e interpelação constante.
Fonte: O Livro Negro da revolução Francesa DIR. Renaud Escande «
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