Os cistercienses escolheram para capital o vale formado pela confluência dos rios Alcoa e Baça, chamada a essa nova cidade Alcobaça. O castelo sobranceiro à colina, mandado erigir por D. Afonso Henriques para protecção dos monges, foi posteriormente destruído por terramotos e caçadores de tesouros.O Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, que além de ser o mosteiro situado mais a sul de entre os 340 que os cistercienses construíram por toda a Europa, a mando de São Bernardo, é um dos cerca de duas dezenas que ainda existem em Portugal. A sua Igreja é, talvez, o mais belo exemplo que resta da arquitectura medieval cisterciense, suplantando mesmo qualquer exemplar da Borgonha, incluindo Fontenay (a igreja dos cistercienses, em Clairvaux, foi transformada em prisão para criminosos loucos).
À semelhança do que acontecia em relação a outras artes, as obras arquitectónicas dos cistercienses tentavam conciliar beleza com simplicidade. Talvez, por isso, alguns especialistas tenham classificado o estilo de «severo» - um termo que, de facto, não parece muito apropiado quando entramos no MOsteiro Alcobaça. Bernardo proibiu o uso de vitrais, dourados e estatuária. Encontramos uma longa nave - que creio ser a maior do país - constituída de pilares brancos esguios que se elevam até aos tectos abobadados, intercalados por feixes de luz que entram através dos vidros transparentes. O padrão e a simetria repetem-se em cada uma das coxias laterais. Mais ou menos a meio da nave encontram-se duas capelas frente a frente, uma com o túmulo de D. Pedro I e a outra com o de sua mulher, D. Inês de Castro. Mulher nobre que integrou a corte portuguesa como a dama de companhia, tendo casado com D. Pedro sem o consentimento do pai deste, que, por vingança, ordenou a sua morte. D. Pedro mandou-a embalsamar e, quando ascendeu ao trono, colocou-a a seu lado, obrigando os cortesãos a beijarem-lhes a mão. Aos pés do túmulo de D. Pedro, existe um baixo-relevo evocando o seu último dia de vida, no leito da morte, alimentando-se de sopa e recebendo o sacramento da unção dos enfermos. Aos pés de D. Inês, está representado o juízo final, com uns, mãos erguidas ao Céu, e outros descendo penosamente o declive rochosos que conduz ao Inferno.
O rei D. Dinis, que ascendeu ao trono em 1279, quando tinha 18 anos, mandou construir o principal claustro ao lado da Igreja. Incluía a projecto a Casa do Capítulo, onde frequentemente se reunia em conselho com o abade e outros membros superiores da ordem, uma câmara real, que, funcionando, em certos períodos, como residência sua e de sua mulher, D. Isabel, aí recebia os convidados, e ainda uma sala tumular real. Considerado como um dos maiores monarcas portugueses de todos os tempos, ligou-se de tal modo aos «irmãos agrónomos» de Alcobaça que os seus cronistas lhe chamaram o Rei Lavrador. Os que arroteavam a terra ficavam isentos de impostos sobre o produto das colheitas, e aos rendeiros que, pondo em prática o conselho dos monges, conseguiam produzir mais e melhor eram concedidos freeholds1 dentro de dez anos.
Foi um projecto pessoal da rainha Santa Isabel desenvolver os pinhais, cuja plantação os monges de Cister tinham iniciado na planície costeira. Os estaleiros, onde os frades construíam navios de madeira, foram também expandidos. Pela primeira vez, desde a era romana, Portugal começava a negociar com o resto da Europa....
No reinado de D. Dinis, Portugal tornou-se um dos primeiros países a inovar nos seguros. Os armadores pagavam taxas à recém-criada Bolsa de Lisboa, que os ressarcia, na eventualidade de um dos seus navios ser assaltado pelos piratas ou afundado numa tempestade. D. Dinis também se notabilizou por ter fundado o ensino superior em Portugal, recrutando para tal professores em Paris. Diz-se que os primeiros estudantes se entregaram de tal modo e tão intensamente aos prazeres citadinos de Lisboa que o rei decidiu transferir a nova universidade para o ambiente mais espartano de Coimbra. Também é referenciado como o pai da literatura portuguesa. Até então, poucos eram os letrado fora da Igreja e quase tudo o que se escrevia era em latim ou borgonhês ( por vezes erradamente chamada provençal). D. Dinis determinou que a língua do povo seria o galaico, tendo procedido a adaptações que a transformaram numa língua distintamente portuguesa. Nela escreveu um grande número de poemas e de trovas. Talvez a sua proeza menos reconhecida a nível internacional tenha constituído na garantia de continuidade dos templários. Todos os livros que conheço sobre esta misteriosa ordem militar dão como certo que ela foi extinta na sequência das perseguições movidas pelo rei Filipe IV de França e pelo Papa Clemente V. Em princípios do século XIV, os cavaleiros templários tinham conseguido em França uma riqueza de tal modo espantos que eram donos de cerca de um terço da cidade de Paris. A família real francesa era uma das muitas que lhes deviam dinheiro. Apesar de tudo, Filipe IV tentou obter um novo empréstimo para financiar a desejada ocupação militar da Bélgica, o que foi recusado pelo grão-mestre, Jacques de Molay. Na sexta-feira, dia 13 de Outubro de 1307, ainda antes do amanhecer, todos os templários, em França, foram detidos por funcionários do rei, que confiscaram, para o tesouro real, toda a riqueza que puderam encontrar. Os monges foram acusados de delitos que iam desde o cuspir no crucifixo à idolatria, e «osculação despudorada». O Papa Clemente V emitiu uma bula dirigida a todos os monarcas da cristandade, a Pastorali Praeminenses, onde se determinava a prisão dos templários nos diferentes países, e a confiscação de tos os seus bens, o que, de acordo com os relatos conhecidos, ditou o fim da ordem.
(Na execução de Molay ele lança a sua famosa maldição, que provoca o fim da dinastia dos capetos, uma das causas para o inicio da guerra do 100 anos, que abre o tempo conhecido pelo outono da idade Média ou a crise dos séculos XIV e XV, açoitado pelo triângulo Maligno constituído pela guerra, fome e peste no qual terão morrido pelo menos 1/3 da população Europeia)
Alguns deles, no entanto, terão escapado à detenção. Diz-se que uma parte considerável do tesouro guardado em Chipre não foi confiscada. Em Portugal, D. Dinis minimizou a carta do Papa. O seu reino, que devia a existência à ordem, precisava agora dos seus membros para guardar a fronteira com a Espanha, ao longo das quais, aliás, tinha mandado construir um conjunto de castelos. Ordenou ao arcebispo de Braga que enviasse uma comissão de inquérito destinada a avaliar as acusações feitas aos templários. Inteiramente ilibados pelo arcebispo, D. Dinis anuiu formalmente às exigências do Papa, decretando a abolição da ordem em Portugal e a confiscação de tos os seus bens, ao mesmo tempo que anunciava a criação de uma nova ordem, a ordem de Cristo, cujo grão-mestre e todos os outros membros eram templários. A eles, na sua nova forma, ofereceu todos os bens e riquezas que lhes tinha acabado de confiscar. Os templários que tinham escapado às perseguições noutros países vieram aqui fixar-se. Crê-se, também, que trouxeram consigo o tesouro de Chipre, que alguns, ainda hoje, tentam encontrar, algures enterrado. Os cavaleiros de Cristo estabeleceram a sua sede em Tomar, nas margens do rio Nabão, perto da c0onfluência com o rio Tejo. Ainda hoje, o seu magnifico mosteiro fortificado domina a cidade. A sua capela é octogonal, uma forma que os templários entendiam que representava a harmonia de Deus com o Homem. Eram da opinião de que o Templo de Salomão tinha sido assim construído. Os monges, para acentuar a sua permanente actividade militar, costumavam assistir à missa, na capela, montados a cavalo.
Os cavaleiros atraíram à cidade artesãos para fabricarem armas, selas, vestuário, peças de olaria, mobília e utensílios agrícolas. Dividiram em herdades grande parte das terras que lhes foram devolvidas pelo rei, entregando-as a uma nova classe de fidalgos, alguns deles, de acordo com os arquivos locais, talvez simpatizantes dos templários vindos de França. Para beneficiar dos freeholds1 tinham de continuar a manter-se em forma como oficiais de cavalaria e, simultaneamente, treinaram os lavradores na arte de cavalgar, tanto em relação ao combate como na arte de esgrimir.
D. Dinis morreu em 1325 e a sua viúva, Isabel de Aragão, retirou-se para um convento, em Coimbra. Casaram quando ela tinha 12 anos, tendo rainha sido mãe muito nova. Pouco dado à monogamia, encheu-se de ciúmes doentios por D. Isabel, mandando-a prender durante algum tempo. libertada, ela mesmo criou, em Lisboa, um refúgio para mulheres vítimas dos maridos e um lar para crianças abandonadas. D. Isabel é actualmente considerada um dos santos mais populares do país. Reza a lenda que, um dia, transportando no avental comida que tinha ido buscar à cozinha real para dar aos pobres, foi interpelada pelo marido, que, gritando, irado, a acusou de roubo. Instada pelo rei a abrir o avental, dele caíram pétalas de rosas.
grande parte da vida da rainha Isabel foi dedicada à resolução de querelas familiares. Dissuadiu o filho a sublevar-se contra o pai, tendo, ainda, em outra ocasião, cavalgado entre os exércitos de pai e filho, desafiando-os a enfrentarem-se primeiros. Depois de suceder ao Pai, o novo rei, Afonso IV, marchou sobre Castela. Ao tomar conhecimento do facto, a mãe abandonou o claustro, galopando a cavalo em direcção ao exército português, conseguindo evitar a guerra, estava ela a começar. Ao regressar a casa terá sido, ao que parece, vitimada pela peste. Com ela acabaram os grandes dias do domínio da Casa de Borgonha em Portugal.
1- Propriedade fundiária normalmente atribuída em regimento perpétuo.
Texto retirado do livro "A Primeira Aldeia Global - Como Portugal mudou o mundo"
Autor: Martin Page - 6º edição Casadasletras
sábado, 10 de julho de 2010
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