Em um dos seus livros, López Quintás conta que um dia, ao entardecer, depois de visitar a catedral de Notre-Dame, enquanto vagueava pela velha Paris, deparou, sem querer, com um pequeno edifício abandonado, com as suas sórdidas janelas cruzadas por sarrafos de madeira. Aquela construção quase em ruínas era o famoso “Templo da Nova Religião da Ciência” que o filósofo francês Augusto Comte tinha erigido fazia século e meio. O contraste foi tão brusco como expressivo. O templo com o qual se pretendera dar culto ao progresso científico estava em ruínas. A velha catedral, pelo contrário, irradiava as suas melhores galas, como na sua brilhante época medieval. A música combinava nela com a harmonia das linhas arquitectónicas, com as belas palavras dos oradores, com o magnífico esplendor litúrgico que num dia de Natal, anos atrás, emocionara o grande poeta Claudel, até levá-lo à conversão.(a)
Kant tinha morrido 6 anos depois de Augusto Comte nascer, Kant já sabia pelos sinais dos tempos que homens como Comte imbuídos do espírito do iluminismo, já estavam prontos para formar fileiras para “despojar o homem dos grilhões irracionais das crenças e conhecimentos supersticiosos baseados na autoridade e nos costumes”., e por isso, como homem religioso, pensou salvar Deus dos intentos da sua criatura, o homem. Além de crer, que o homem conseguisse eliminar Deus da história e do mundo, foi com essa ameaça em mente que desenvolveu a sua filosofia, ou seja, creu que o Homem pudesse salvar Deus.
E foi com estas ideias em mente que desenvolveu a sua obra, e no entanto a que custo, quanto o Homem teve que baixar-se, para que Deus fosse inacessível à razão humana!
O Texto que se segue foi retirado de um artigo foi escrito por Pe. Leonel Franca S.J. que está no site: http://www.permanencia.org.br/revista/filosofia/leonel3.htm onde explica-nos as contradições e problemas insoluvés da filosofia de Kant e um pouco das consequênçias do Agnoticismo Kantista no Homem, em baixo, segue já a parte final do texto devido ao seu tamanho não meti todo, onde fala-nos das consequênçias do Agnoticismo de kant.
Boa Leitura!
A estrutura do conhecimento humano tal qual foi arquitetada pelo solitário de Königsberg não suporta a cúpula de uma demonstração racional da existência de Deus, mas não chega a esta conclusão agnóstica sem arruinar pela base toda a nossa vida intelectual. Ruiu a teodicéia racional, mas com ela, todo o edifício científico. Não conhecemos a Deus, mas também não conhecemos a nenhuma outra realidade. O mundo e o homem serão para sempre incógnitas indecifráveis; nega-se a inteligibilidade radical do ser, nega-se a inteligibilidade dos mesmos fenômenos. A própria existência de uma realidade extramental KANT não a pode afirmar senão a preço de uma contradição imanente. JACOBI, contemporâneo de KANT e um dos primeiros e mais atilados críticos de sua obra, escreveu com acerto: “Sem a suposição das coisas em si, não posso entrar no sistema; com esta suposição, nele não posso ficar”. FICHTE, entre os contemporâneos do filósofo, COHEN em nossos dias, viram esta impossibilidade e, por isto, enveredaram para o idealismo absoluto como conseqüência lógica do kantismo. O solipsismo mais desesperador, que isolaria cada inteligência em si mesma sem possibilidade de entrar em contato com o mundo das coisas e no convívio com as outras inteligências, seria o paradeiro fatal desta filosofia destruidora. Um imenso polvo a bracejar no vazio os longos tentáculos em esforço eternamente estéril de aferrar uma consistência; eis a imagem da inteligência humana na filosofia nevoenta deste filho das nórdicas brumas.
Desta concepção da inteligência nascem todas as lutas e antinomias, todas as incompatibilidades e divórcios que desvirtuam a síntese kantista. A unidade harmoniosa, filha da sabedoria que sabe ordenar, sucedem os contrastes de dualismo inconciliáveis. Dualismo entre os sentidos e a inteligência; entre a razão teórica e a razão prática; entre o mundo interior do espírito e o mundo externo da matéria; entre a liberdade noumênica e o determinismo dos fenômenos; entre a virtude e a tendência à felicidade; entre a moralidade e a religião; entre a filosofia e a vida.
As antíteses vão por vezes a dilaceração da ruptura ao que há em nós de mais profundo e inextirpável. Aspiramos irresistivelmente à felicidade que reside na perfeição da natureza, mas não podemos agir em vista da perfeição que felicita porque ofendemos a moral que é a lei do homem. As questões metafísicas impõem-se à razão com uma necessidade natural inevitável, mas resolve-las é emaranhar-se em contradições insolúveis. Deus é indispensável para a coroa da ordem moral mas agir por amor de Deus é uma heteronomia que torna imoral a ação e desvirtua a autonomia da vontade. Sem Deus, sem liberdade, sem imortalidade não podem viver as consciências, mas a razão pura declara que a afirmação objetiva destas realidades implica antinomias inextricáveis.
Nunca se fez à unidade, à harmonia, ao equilíbrio sadio da personalidade humana violência mais dolorosa nem mais funesta.
Pela sua teoria gnoseológica, pela separação entre a esfera do pensamento especulativo e as exigências da vida moral, KANT é talvez o filósofo que mais contribuiu para a difusão moderna do agnosticismo. Não é difícil estabelecer as transições dialéticas e o itinerário histórico entre o kantismo de um lado e de outro o protestantismo liberal, o pragmatismo e o modernismo. SCHLEIERMACHER e RITSCHL sentiram poderosamente a influência de KANT, SPENCER, LITTRÉ e os agnósticos ingleses mais recentes reportam-se às suas críticas da teodicéia racional como a resultados definitivamente adquiridos pela filosofia. A desconfiança nas forças nativas da inteligência, a supervalorização dos motivos alógicos, sentimentais e pragmatistas – que encontramos como características de uma parte do moderno pensamento religioso – prendem as suas raízes mais profundas nas duas Críticas de E.KANT. “É absolutamente necessário que nos compenetremos da existência de Deus, mas não é tão necessário que a demonstremos”.
(a) Fonte: É Razoável Crer? Questões Actuais sobre a Fé – AGUILÓ Alfonso – Tradução: Roberto da Silva Martins - Editora Quadrante - São Paulo 2006 - Colecção Vértice; 60.
terça-feira, 16 de junho de 2009
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